Cresci imaginando que a Guerra do
Paraguai tivesse sido daquelas batalhas que orgulham qualquer exército, qualquer
Nação, e eu via, no meu imaginário construído nos bancos de escolas, eu via –
repito - as medalhas pendentes do peito verde-oliva, e via com orgulho também a
Marinha do Brasil trazendo os louros daquele embate sul-americano, talvez o
maior deles travado nos chãos da América Latina. Dali saíram os heróis
Tamandaré, Duque de Caxias etc, e lá a terra chupou o sangue de muitos
brasileiros, tombados em chão alheio sob o braço do destemido soldado cidadão
paraguaio. Aprendi isso, sim senhor, nas aulas de História do Brasil. E na
minha cabeça, fresquinha daquelas honrosas páginas de nosso povo varonil, pela
minha cabeça, digo, desfilavam confrontos e mais confrontos, nossas tropas
resistindo heroicamente, munidos da clava forte, peito a peito com o inimigo
que nos “ameaçava”. Nossos Comandantes lá estavam, destemidos, com suas
estratégias avassaladoras, seu amor à Pátria amada à flor da pele, cravando
seus nomes na história dessa mesma pátria com seu brado retumbante, fazendo
brilhar, em raios fúlgidos e naquele evento, o sol da “nossa” liberdade. Ó,
Pátria amada, idolatrada! Impunha-se mostrar que este país é gigante pela própria
Natureza. A mim me parecia ver, sob os céus paraguaios, tremular estrelado o
lábaro verde-amarelo. Assim fiquei eu deslumbrado, envaidecido, ao tempo de
estudante e muito além dele. Fazia e faz esse efeito a história falada e
escrita nos currículos escolares. Mas essa é uma história contada sob a ótica
da brasilidade, no calor do nacionalismo exacerbado, na escuridão do
contraditório, ao arrepio das razões do “inimigo” e das terceiras intenções. Salvar
nossa pele era preciso. Vejamos a História real, substituída a emoção pela
razão: Andava o Paraguai com as próprias pernas, e ocupava terrenos novos na
ceara econômica, e dilatava suas fronteiras culturais sem se curvar ante as
potências europeias da época. Numa frase, era um País absoluto, dono de seu nariz,
independente e bem sucedido. Mas a
Inglaterra não gostava disso. Essa não era uma democracia que caía nas graças
dos britânicos, ávidos de tutelados que fossem dependentes de sua revolução
industrial em busca, a qualquer custo, de clientes para seu mercado expandido.
Em não lhes sendo como colonos, os paraguaios lhes pareciam rebeldes, metidos
demais, pretensiosos demais, e careciam de um puxão de orelhas. Mas o rei todo
poderoso não queria sujar as próprias mãos com esse povinho de meia pataca, em
que pese ser o castigo coisa líquida e certa, ato decidido; não queria e não
era preciso, pois havia bem ali dos lados, na periferia e sempre ao inteiro
dispor, porque seus dependentes, braços e sangue à mão. Bastava, só, criar o
pretexto, o enredo, a razão deslavada, mas isso era o de menos. E foi dito e
feito. Era 1864 e Solano Lopes, vejam só, queria uma saída hídrica, um caminho
de água para o Oceano Atlântico, e a Bacia do Prata estava logo ali, ao pé. Mais
um navio, menos um navio, que diferença faria? Outra coisinha mais que o Paraguai
queria era aumentar um tico seu território, coisa em que não era diferente de
seus vizinhos desafetos. Um pedacinho do Brasil e outra nesga da Argentina era
quanto bastavam para as pretensões paraguaias. Ora, Brasil e Argentina não
estavam a fim de colaborar, e isso fazia sentido. Vai daqui, vai dali, o
Uruguai entrou na briga contra a sozinha Pátria Paraguaia. Estranho isso, não? Mas,
reparem: Só esta última era independente
dos europeus, sobretudo da Inglaterra. Foi a sopa no mel! A Tríplice Aliança (Engraçado,
era uma aliança de quatro integrantes, porque ali entrou o dedinho sujo
britânico) formou fila com seus vizinhos brigões e fez suas as queixas deles. Impunha-se
banir aquele mau exemplo da América Latina. Crescer sem submeter-se ao poder
inglês? Nem pensar! Vai daí, a desculpa se materializava, as razões estavam
postas. Brasil e Argentina lutarem em defesa de seus territórios era coisa
justificável, necessária até, mas numa briguinha normal, comezinha nas lutas de
fronteiras. Mas o gigante europeu não queria por menos, e o negócio era acabar
com Paraguai, varrê-lo da história, torná-lo pó, fazê-lo apenas uma quimera.
Dir-se-ia coisa passional: Ou é meu ou não é de ninguém. Ou come na minha mão,
ou se dana. É a Lei do mais forte. E eis que, senão quando, vieram a Batalha do
Riachuelo e a luta de Uruguaiana, entre outras, sob a tentação das libras esterlinas,
derramadas em nome do Reino Unido nos cofres de suas “marionetes”, e mais a
oferta de armas e munições. Diante desse maná, até o Uruguai chegou junto – tô
nessa! Só um detalhe: aquela dinheirama era emprestada, moçada! Não existe
almoço de graça. E a tramóia durou seis anos. Setenta por cento da população
paraguaia, a maioria homens, foi dizimada, e aquela Nação, como queria a
Inglaterra, nunca mais foi a mesma. Muitos brasileiros (fazia parte) perderam
ali suas vidas – nenhum do lado de lá do Atlântico -, mas outros saíram heróis, recebidos da banda de cá como grandes estrategistas, o maior deles
Duque de Caxias. Conde D`eu foi outro que trouxe seus louros, não sei se por algum mérito próprio ou por
parentesco com o Imperador Pedro II. Deixa isso pra lá. Afinal, a política não
começou ontem. O fato concreto é que a turma do vamos que vamos, embora morto o
“inimigo”, também se deu mal, e os três mosqueteiros (ou os três patetas?) saíram
de lá mais endividados e mais dependentes (da Inglaterra, será?). Tão somente
de uma coisa até hoje não me dei conta: Descontado o fato de o exército
brasileiro ter-se consagrado como força política e ganhado experiência bélica,
quem foi, de fato, o único beneficiário daquela COVARDIA. Tá aí um bom tema para
discussão. Deixo à análise dos mais velhos e/ou mais sabidos. Parece-me que os
paraguaios estão querendo se vingar, nos atingindo naquilo que é, ou já foi,
nosso orgulho: O FUTEBOL. Dos males o menor. O feijão-com-arroz de outros
tempos virou uma indigesta feijoada. Pá daqui, pá dali, estamos “tombando” ante
os paraguaios, que “disparam” contra nós seus tiros de chuteiras, ferindo de
morte nosso orgulho de pentacampeões.
Então, eis aí a história da Guerra
do Paraguai, senão a mais verdadeira, o quanto possível a mais próxima da
realidade, contada por quem sabe pouco, mas que está muito indignado. E como,
em minha talvez inconsiderável opinião, na linha de frente de cada batalha das
guerras deviam ser postos aqueles governantes que a declararam, quem sabe
nossos “zés-povão” do passado não tivessem morrido para glória e graça daqueles
que fizeram a Revolução Industrial com nosso ouro, inclusive. Na guerra ou fora
dela, mas vale a vida dos humildes que a glória dos privilegiados.
Uma ótima aula de história passada e atual. Abraço.
ResponderExcluirO novo visual do blog está bem melhor e com mais cara de prosa e poesia...rs.
ResponderExcluirOlá, filosofia calvinista, obrigado pelo apoio. O novo visual tá mesmo melhor. Abraços
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